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KAREN DA COSTA MACHADO MOREIRA

Advogada | Especialista em Direito Ambiental (UFRGS) | Especialista em Compliance Certificada CPC-A (FGV/LEC) | Servidora Pública RS | Professora Convidada de Cursos de Especialização e Capacitação em Direito e Compliance Ambiental | Vice-Presidente do Instituto Piracema | Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB/RS | Residente em Direito Ambiental da Casa Norma | Membro voluntário do Jurídico do Sistema B-RS | Representante da OAB/RS na Câmara Técnica de Legislação do Conselho Municipal do Meio Ambiente (COMAM/PREFPOA) | Consultora Jurídica em Meio Ambiente. há mais de 15 anos

Muito tem se falado sobre Programas de Compliance, estrutura que é vista como solução, quase como um sinônimo de segurança jurídica e operacional em variadas áreas, e assim assume direcionamentos conforme o tipo de empreendimento, ou de área que precisa de atuação especializada, como Compliance Trabalhista, Compliance Tributário, Compliance Ambiental, entre outros.

Em linhas gerais, o Compliance se refere à conformidade das atividades da empresa às leis e regulamentações, bem como às políticas e processos internos. Ou seja, é um programa pelo qual uma empresa consiga prevenir, detectar e responder a condutas ilegais (regulação e normas internas), promover cultura de condutas éticas, alinhar processos e controles no sentido da sustentabilidade ampla do negócio. Na área de Meio Ambiente, o Compliance Ambiental prevê o (re)desenho e a adoção de critérios, controles, protocolos, políticas, visando aperfeiçoar os diversos processos e procedimentos da empresa, no sentido da integridade ambiental. Pode parecer que se está falando do óbvio: as normas ambientais devem ser obedecidas, as condicionantes de uma licença devem ser atendidas. A regularidade do empreendimento depende disso (também), não é?

No entanto, a realidade mostra que inúmeros são ainda os desafios quando se fala em Direito Ambiental. Notícias abundam sobre desastres ambientais, sobre atividades que extravasam limites e/ou atuam em desconformidade, causadoras de impactos ambientais, Também a economia tem mostrado que não haverá mais espaço para empreendedores e empreendimentos não alinhados a um comportamento dito “sustentável”; atender a parâmetros ESG, por exemplo, pode determinar os mercados, talentos e consumidores que aquela empresa acessará.

Mas o que é esse comportamento “sustentável”, essa postura que a empresa deve expor interna e externamente? Ricardo Voltolini, em seu livro “Escolas de Líderes Sustentáveis – Como empresas estão envolvendo e educando líderes para a sustentabilidade”, destacou os dez atributos mais relevantes dentro de um marco referencial apresentado pelo Pacto Global da ONU em 2010, denominado Plano para a Liderança em Sustentabilidade Empresarial. Destaco aqui apenas quatro, que refletem mudança de paradigma:

→ Analisar permanentemente cenários, avaliar riscos e oportunidades de negócio relacionadas com as questões de sustentabilidade para a empresa e o setor.

→ Rever processos e modos de produzir, desenvolver produtos e serviços ou conceber modelos de negócio que contribuam para promover a sustentabilidade.

→ Envolver e educar acionistas, conselho de administração, investidores, funcionários, colaboradores, fornecedores, comunidades, clientes, organizações da sociedade civil e governos.

→ Monitorar e mensurar desempenho baseado em métricas específicas para, por exemplo, gestão da água, energia, emissões de gases de efeitos estufa, poluição, efluentes, e dos serviços ecossistêmicos.

Essa mudança de paradigma, esse abandono de antigas práticas industriais e comerciais, cobra necessariamente transparência, cobra posicionamento em favor da sustentabilidade como um comportamento, uma postura que demonstra visão holística, sistêmica, aberta, acolhedora, colaborativa. Conhecemos bem o uso da exposição apenas externa como estratégia (insustentável) de negócio. A empresa se mostra como “amiga da natureza”, usando termos e conceitos vagos e imprecisos para passar imagem de que é sustentável, de que seus produtos ou serviços não agridem a natureza, ou até são benéficos, o que não reflete a realidade interna da empresa. A intenção é usar esse “marketing verde” para acessar consumidores e mercados, sem lastro em ações concretas. O nome disso é greenwashing, lavagem verde em tradução livre, termo criado em 1986 pelo ativista ambiental norte americano Jay Westerveld. E isso – essa preocupação e combate – pode ser transportado totalmente para o Compliance, não só Ambiental, mas para qualquer Programa de Compliance, genérico ou especializado, que se pretenda efetivo. Hoje Programas de Compliance já são obrigatórios em diversas normativas (vide diversas normas – dentre as estaduais temos como exemplo Rio de Janeiro, Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Amazonas, Goiás; como também a nova Lei de Licitações – Lei Federal 14133/2021), e o movimento do mercado já sinaliza certa “cogência”, como podemos vislumbrar na exigência de implantação de compliance nas contratações entre multinacionais e seus fornecedores. Também o Direito Ambiental está se ocupando de normatizar os Programas de Compliance Ambiental e sua obrigatoriedade: o Projeto de Lei 5442/2019 está em tramitação na Câmara dos Deputados, pretendendo regulamentar os programas de conformidade ambiental em empresas públicas e privadas que exploram atividade econômica potencialmente lesiva ao meio ambiente.

A forma e seriedade como o mercado, as empresas, empresários, Poder Público, e sociedade, tem encarado o Compliance (seja genérico, ambiental, ou outro), determina o sucesso desse instrumento, determina se ele atingirá todo o seu potencial transformador e garantidor de ética, controle, segurança e transparência às atividades, ou se apenas existirá no papel, adotado “porque uma lei exige”, para redução de penas, acesso a vantagens ou mercado, para contratação com o Poder Público, mas sem nenhuma aplicabilidade prática, sem efetividade, um verdadeiro Compliancewashing, que cedo ou tarde será “desmascarado” – seja em decorrência de processo judicial, seja em razão de impacto ambiental que demonstre a ineficácia ou ineficiência do programa, seja em decorrência de due diligence realizada por potenciais parceiros comerciais, ou de auditorias, denúncias, ou tantas outras possibilidades (pois assim como o greenwashing, essa prática é insustentável) – e terá consequências ainda piores do que em postura íntegra reconhecer que (ainda) não possui um programa, e desenvolvê-lo em prol da sustentabilidade ampla do seu negócio.